A Sinfonia da Morte - C. B. Kaihatsu



Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Ed, Natanael e Carlos, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
C. B. Kaihatsu ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.

A Sinfonia da Morte

 C. B. Kaihatsu

Dedos frenéticos tocavam a melodia que anunciava a eminência de sua morte. Cada nota ecoava como um golpe em seus ouvidos. O som se tornava cada vez mais alto, acompanhando a fúria assassina do pianista.
Gael lamentou-se por não ter acreditado na história que todos os moradores da pequena cidade lhe contaram.

***

Algumas semanas antes

Para cuidar da saúde, o jovem Gael se mudou para uma pequena cidade rural, o médico da família havia recomendado. Lá ele teria um cotidiano mais tranquilo e ficaria longe da vida boêmia, amigos, bordéis e jogatinas.
Ficou combinado que passaria uma estadia na casa de tio Alfredo, um parente que ele nunca vira, um recluso homem octogenário. Ele nunca apareceu em nenhuma festividade da família.
Gael chegou logo pela manhã, estranhou porque o tio não o recebera, um de seus empregados lhe mostrou qual era o seu aposento.
A casa tinha um estilo gótico, todas as cortinas da sala estavam parcialmente fechadas, o rapaz preparava-se para escancará-las, mas o grito de advertência do mordomo o deteve. O homem explicou que eram ordem expressa de tio Alfredo.
Nos primeiros dias, Gael achou a cidade entediante, depois acostumou-se e começou até a se afeiçoar ao lugar. Achava graça das histórias que contavam por lá. Uma delas envolvia sua família, ou melhor, o casarão de tio Alfredo.
Reza a lenda que a cada cinco anos, no dia cinco de maio, às cinco horas da manhã, a sinfonia número cinco de Beethoven começa a tocar no casarão e sua melodia ecoa por toda a cidade.
Gael sempre ria-se quando algum munícipe alertava-o com essa história, diziam que há anos forasteiros sumiam exatamente nessa data. Rogaram ao rapaz para que este fosse embora dali, ou que se acomodasse em alguma pensão, um dos moradores até ofereceu sua casa como guarida para Gael.
De fato, havia um piano no casarão, mas nem o tio e nenhum dos empregados tocaram o instrumento de teclado, pelo menos não durante a estadia de Gael.

***

Era dia quatro de maio, Gael estava determinado a ficar acordado até às cinco da manhã e aparecer triunfante e ileso para os moradores da pequena cidade.
Faltando um quarto de hora para às cinco daquela madrugada, Gael sentou-se na banqueta de frente ao piano, a única coisa que aprendera a tocar, fora uma valsa cujo compositor ele não se lembrava quem era. Se soubesse tocar a sinfonia número cinco completaria sua diversão.
Notou um recorte antigo de jornal no chão. Datava do século XIX,  havia o retrato de um homem que assemelhava-se a ele, na legenda dizia que tratava-se de Alfredo Van Dyk um proeminente pianista famoso por suas perfeitas execuções das obras de Beethoven, sobretudo a sinfonia número cinco.

***

Cinco da manhã do dia cinco de maio

Gael amaldiçoava-se por ter sido tão tolo, sentia sua alma se esvaindo a cada nota que o tio tocava.
Alfredo havia feito um trato com o demônio para que pudesse viver pela eternidade, mas uma vida deveria ser ofertada no lugar da sua. Ao longo de décadas ele preparava artimanhas para atrair os desavisados ao seu casarão, mas dessa vez foi tão fácil, um descendente dos Van Dyk fora lhe dado de bom grado.
Naquela madrugada ninguém ousou sair de casa, nem mesmo os trabalhadores das primeiras horas. Gael nunca mais foi visto em parte alguma. E Alfredo estava assegurado pelos próximos cinco anos.




Comentários

  1. Gente, estou toda arrepiada! Muito bom seu conto ♥

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  2. A cada cinco anos, no dia cinco... Ainda bem q o Clube dos Cinco não espera tudo isso para brindar a gente com contos como esse! Majestoso!

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  3. Esses contos dariam belas histórias adorei 🙋‍♀️

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