Os Mistérios do Rio - Meg Mendes



Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Ed, Natanael e Carlos, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Meg Mendes ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.


Os Mistérios do Rio

Meg Mendes


As águas escuras do Rio são Francisco traziam prosperidade para a população ribeirinha, mas também temores. Era comum os pescadores irem ressabiados para a lida, rezando por suas vidas e por suas embarcações.
Muitos eram os casos de barcos virados e relatos de que o protetor das águas era o responsável. Dizia a lenda que ele era um ser meio anfíbio e meio humano, com pés e mãos e pato, um negro alto e forte que vivia nas águas e que jamais deixava o rio.
O que a lenda não dizia era que mesmo diferente ou até inumano, possuía um coração bom e apaixonado.

Lorena era uma jovem ribeirinha, sua família tirava seu sustento das águas e tratavam as lendas com reverência. Desde muito pequena, ela ouvia as histórias que sua avó contava. E por mais que tentasse evitar, sua paixão pela água a dominava.
Era uma exímia nadadora e mesmo todos a aconselhando a se manter distante das águas escuras e misteriosas, não podia controlar. Foi em um dia quente enquanto nadava que o viu.
No início foi difícil enxergar com a água turva, mas quando ele se aproximou, pôde ver.
O susto a fez inspirar água e começou a perder o fôlego, suas vias respiratórias ardiam e mesmo sabendo que não podia respirar, seu corpo buscava por ar. Em poucos segundos a visão foi escurecendo, então desmaiou.
Lorena abriu os olhos devagar, estava deitada sobre o leito terroso do rio e diante dela olhos muito claros, de um verde quase transparente, a observavam com curiosidade. Eram como pedras de água marinha e pertenciam a um homem forte de ombros largos, pele escura e luminosa. Sua beleza fez Lorena perder o fôlego novamente.
Sem dizer uma palavra, e ao constatar que a moça estava bem, ele se levantou e se afastou indo em direção ao rio. Ele estava nu e a visão do corpo dele fez Lorena corar.
 — Ei, quem é você? — ela se sentou e o olhou mais atenta.
Sem responder, ele continuou andando depois de parar por um segundo para olhá-la.
— Não vá! — a moça suplicou.
Ele se deteve pela segunda vez, mas sem se virar.
— Eu voltar. Rio precisar de mim.
Apesar da fala incorreta, ela entendeu perfeitamente.

Por dias, Lorena se lembrou daquele encontro, passou a sonhar com o Negro D’Água. Em uma noite tipicamente quente, ela estava agitada em seu sono, o corpo coberto de suor e a pele aquecida; tudo se aquietou quando sentiu dedos frios lhe acariciando a testa, o toque foi tão delicado que pensou ser só uma brisa, mas ao abrir os olhos viu o brilho dos olhos dele no escuro, podia apenas distinguir os contornos do corpo másculo.
Então noite após noite ele retornava. Cada segundo que passavam juntos não seria suficiente para suprir a falta que Lorena lhe fazia quando não estava por perto. Apesar de diferente, possuía uma inteligência fenomenal, aprendia rapidamente os costumes humanos, já não ficava nu e falava como um homem a terra. E foi ficando, primeiro passou uma noite, depois metade do dia, até não querer mais voltar.
Como não tinha nome, Lorena passou a chama-lo de Mariano por causa da cor de seus olhos. A união deles, apesar de repentina, não foi questionada.
Um lindo romance que gerou fruto.
Lorena ficou apreensiva quando descobriu-se grávida de um ser meio humano e meio animal. Temeu por seu filho, mas o amor que sentia desanuviou sua mente.
Os meses foram se passando e o povo ribeirinho enfrentava dificuldades. O Rio São Francisco, antes farto, perdeu sua abundância e as redes retornavam vazias para os barcos. A terra próspera e o comércio pesqueiro estavam morrendo, assim como o próprio rio.
— Eu preciso voltar, sem mim os peixes irão morrer e todos passarão fome.
A moça estava com sete meses de gestação.
— O que farei sem você aqui? E nosso filho?
— Eu retornarei de tempos em tempos para vê-los. Não quero me afastar, mas entenda, eu sou a força do rio.
E com a promessa de que retornaria, Mariano se foi, voltou a ser o Negro D’Água, o misterioso guardião do rio.

Comentários

  1. Que conto mais lindo, Meg! Fiquei esperançosa de saber como seria o restante da gravidez, como ela enfrentaria a vida desse jeito ❤

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    1. Obrigada!!! Fico muito feliz que tenha gostado... Esse conto dá margem para outros ou até uma expansão da história, quem sabe eu não o faça! ♥ ♥ ♥

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  2. Adorei o conto. A forma como foi narrado e o caminho que a historia teve ficaram ótimos. Parabéns. Sucesso.

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  3. Eu sei que é um conto.Podia ter continuacao�� fiquei curiosa. Muito bom

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    1. Ahh que bom que gostou, fico muito feliz. Estou pensando em fazer uma continuação sim... Vamos ver se dá certo ♥

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