As Gêmeas Fantasmas - Meg Mendes


Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Morphine, Naiane e Natasja, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Meg ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.



As Gêmeas Fantasmas

Meg Mendes




Naquele pequeno vilarejo, nunca houve um nascimento como o de Eloise e Elena. Elas eram irmãs gêmeas, mas o povo não sabia o que era isto. Nunca tinham presenciado em suas pacatas vidas pessoas com os rostos iguais.
As outras crianças cresceram tendo medo das irmãs. Todos pensavam que elas eram obras encarnadas do diabo na terra. Sempre que saiam para brincar, as demais crianças se escondiam em suas casas. As duas cresciam isoladas por todos.
Elas tinham 9 anos e eram bem diferentes entre si. Mesmo com pouca idade, Eloise tinha um senso de autoproteção, o que as crianças lhe diziam ou faziam não lhe abalava. Já Elena era mais sentimental, deixava se abater com a falta de cordialidade para consigo. A indiferença lhe era amarga, sentia uma melancolia indizível.
Aos poucos Elena foi perdendo o brilho, já não se alimentava e não saia para brincar. Não saia mais de casa e por vários dias se recusou a levantar da cama. Sua irmã tentava lhe convencer de que não precisavam de ninguém, que tinham uma a outra e que isso bastava. Mesmo assim, Elena se abatia cada vez mais.
Eloise não queria que as pessoas soubessem que sua irmã estava doente. Isso só aumentaria o falatório a respeito das duas e tinha medo de que as maldades faladas pudessem piorar o estado de Elena. Decidiu que manteria em segredo o que se passava em sua casa. Mesmo morando em um vilarejo minúsculo, tentaria de todas as formas evitar que soubessem.
As irmãs, assim como o jeito, usavam sempre os cabelos de forma diferente uma da outra. Eloise sempre usava seus cabelos soltos, ao contrário de sua irmã que gostava de manter sempre uma trança longa e bem arrumada. Isto refletia o espírito de cada uma.
Num dia, ela saiu com os cabelos presos em forma de uma trança, e nenhuma pessoa do vilarejo percebeu que ali estava Eloise ao invés de Elena. O que perdurou por bastante tempo.
Elena estava fraca e logo o corpo sucumbiu a falta de nutrientes e a desolação que sentia.
Todo o vilarejo apareceu no enterro de Elena, não compadecidos pela dor que a família sentia, mas para terem certeza de que aquela abominação da natureza, como eles pensavam havia finalmente partido desta terra. A falta de compaixão finalmente atingiu Eloise em cheio, ela que nunca havia ligado para as maldades vividas, naquele momento sentia uma raiva crescente de cada pessoa ali. Decidiu que manteria viva a presença da irmã no mundo dos vivos, faria cada um pagar pelo que faziam.
Depois de alguns dias, vendo-se sozinha e com raiva, Eloise colocou seu pequeno plano de vingança em prática. Vestiu-se como Elena, trançou cuidadosamente os longos cabelos e saiu por aí. Era reconfortante ver o terror estampado no rosto de todos.
            Toda vez que ela aparecia como Elena, as pessoas tinham a certeza de estar diante de um fantasma amaldiçoado, enviado pelo próprio diabo para destilar seu veneno entre os vivos daquele lugar.

***

No mundo dos mortos, Elena sentia-se mais sozinha ainda, como era possível? Via sua irmã na terra, viva, fingindo ser ela. Sabia que para Eloise era mais fácil assim. Queria poder voltar e confortá-la, brincar juntas novamente. Desejou com toda sua força.
Numa tarde de tempestade, Eloise estava em casa brincando em frente ao fogo. Alguns trovões reverberavam e os raios iluminavam o recinto.
Ela pensou ter visto uma silhueta de repente. Podia jurar que era Elena, mas isto seria loucura. Havia pouco tempo tinha sepultado a irmã. Levantou-se de onde estava e olhou mais atentamente. Um raio cortou o céu, o estrondo foi tão forte que as tábuas sob seus pés pareciam tremer. Apertou os olhos com o susto e quando os abriu Elena estava diante dela.
Estava um tanto pálida e translúcida, mas ainda assim era sua irmã. O grito que saiu da garganta da menina poderia ter sido ouvido a uma longa distância. Sua alma saia de seu corpo junto com o ar que passou por sua boca.
Quando a mãe chegou na pequena sala, a menina estava caída com olhos e boca escancarados estampando todo o horror que sentiu em seu último momento de vida. A dor era imensa. Sentiu que a pequena Eloise não suportou a perda de sua irmã, e sucumbira junto deixando um vazio naquela casa.

***

Vendo o que havia feito, Elena se culpou. Não era sua intenção assustar Eloise, muito menos matá-la. Queria apenas estar junto de sua irmã novamente. E como se houvessem atendido seu pedido, Eloise surgiu diante de si.
Estavam juntas no mundo dos mortos, reunidas pelo amor que sentiam uma pela outra. E também pela raiva que consumia suas pequenas almas. Elas decidiram assombrar os vivos por toda a eternidade aprontando todos os tipos de travessuras.

Aquele vilarejo ficou conhecido como o lar das gêmeas fantasmas.

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