A Missa da Meia-Noite - Meg Mendes
Cinco.
Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Ed,
Natanael e Carlos, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em
volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Meg
Mendes ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do
Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.
A Missa da Meia-Noite
Meg Mendes
A
badalada dos sinos ecoava pela praça, os moradores de rua eram embalados pelo
som que os enchia de esperanças. Naquela hora os carros eram parcos e até
pareciam diminuir, o que era improvável para cidade mais movimentada do país.
No
interior da Catedral da Sé, o som se alongava e fazia as colunas altas e os
arcos neogóticos vibrarem.
Era
o quinto dia do mês, e naquela noite os espectros surgiram da cripta que se
encontrava debaixo do altar principal. As vozes sepulcrais ressoavam com o
cântico canônico, a missa estava iniciada.
Quem
passava pela praça via a luminosidade que escapava pelos vitrais. As portas
grossas cerradas, não impediam que eles ouvissem os cantos. Não faziam ideia do
que ocorria ali, porém ninguém jamais se atreveu a entrar. Todos passavam como
se nada estivesse fora do lugar, o som os hipnotizava e os mantinha longe.
Conta
a lenda que um jovem músico, famoso por ouvir os tons quase imperceptíveis, em
uma noite do dia 5 se aventurou a entrar na Catedral.
Assim
como as demais pessoas, ele ouvia o cântico, diferente das outras, ele não
havia sido hipnotizado e sua curiosidade o levou para dentro.
Centenas
de velas era o que eliminava interior da igreja matriz de São Paulo. Por detrás
do altar havia uma passagem que estava aberta, mas que durante os outros dias
não parecia nada além de uma parede de mármore maciço. Porém naquela hora, a
meia noite do dia 5 de um frio julho, passavam por ali bispos e arcebispos.
Todos bem vestidos, alguns empoeirados e todos putrefatos, alguns desnudos das
carnes do corpo.
Era
uma cena horrenda e o cheiro que escapava da cripta pela porta aberta nauseava
o rapaz.
A
missa se seguiu alternando entre cânticos e orações que saíam das gargantas
inexistentes dos mortos como um coral fúnebre de tenores. Um arrepio correia
pelo corpo do músico. Ao mesmo tempo que a cena era aterradora também era bela.
Não conseguiu conter um suspiro de admiração, e mesmo com as vozes elevadas,
foi audível suficiente para os cadáveres mais próximos olharem para ele.
O
medo o fez congelar, mal podia respirar, o ar passava com dificuldade pelos
lábios entreabertos. Sentiu quando as mãos frias e rígidas o seguraram e o
arrastaram para o altar principal.
Ele
se debatia furiosamente tentando se soltar, entretanto eles eram fortes.
Conseguiu se desvencilhar por um segundo, mas para onde quer que tentasse
correr dava de cara com cadáver. O rapaz estava cercado e um desespero enorme
começou a tomá-lo.
As
vozes não cessaram enquanto ele era obrigado a atravessar a nave principal, nem
quando os seus gritos desesperados ecoaram pelas estruturas do século XIX.
***
Ao
bater do sino, as vozes pronunciaram em sincronia:
"Amém!"
Apenas
uma badalada. Era o fim da missa.
Os
corpos pútridos arrastavam se pela passagem atrás do altar principal, o jovem
músico era levado com eles para o descanso "eterno" que só seria
interrompido no mês seguinte.
A
pesada peça de mármore foi colocada no lugar pelo lado de dentro selando a
cripta da Catedral da Sé e levando consigo o pobre rapaz curioso. No salão, não
era possível ouvir os lamentos e pedidos de socorro dele.
A
passagem só se abriria no próximo dia 5, quando seria celebrada a missa da
meia-noite.
Um conto sinistro e acredito que todos aqueles que já estiveram na Catedral da Sé se arrepiaram ao ler este conto. Ao passear pelos corredores da Catedral sempre imaginei como seria aquele lugar ao cair da madrugada, agora tomou forma meus pensamentos mórbidos. Parabéns, começaram muito bem os trabalhos.
ResponderExcluirMuito obrigada, Cláudia!
ExcluirFicamos muito contentes que tenha gostado!
Claudinha, que bom quer gostou ♥
ExcluirAcho que toda a catedral com a herança gótica traz em si algo de tétrico e ao mesmo tempo, algo de maravilhoso. Esse conto me fez pensar em fantasmas que ficam se arrastando por eras e eras, esperando encontrar sua paz. Adoravelmente assustador!
ResponderExcluirSempre fico imaginando o que acontece quando está escuro... Muito obrigada!
ExcluirPor Cristo! Eu enlouqueceria preso lá dentro!
ResponderExcluirSe fosse comigo eu teria morrido de susto!!! rsrs
ExcluirEsse tipo de situação em que não há escapatória, não adianta correr, lutar contra "algo" mais forte que eu, invencível, isso me dá um medo! Seu conto me causou isso e ainda por cima essa ambientação...
ResponderExcluirObjetivo atingido... Que bom ♥
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