Cabeça de Abóbora - Natanael Otávio



Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Ed, Natanael e Carlos, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Natanael Otávio ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.



Cabeça de Abóbora


Natanael Otávio



21 de outubro de 1933
            A Casa Vazia foi ocupada. Papai disse que por uma família de ingleses, que certamente eles não sabem que o lugar é mal assombrado. E o corretor, aproveitando o fato de serem imigrantes, deve ter ocultado isso deles.
Tenho 13 anos, moro nesta vila desde que nasci, é a primeira vez que tenho vizinhos de frente.

23 de outubro de 1933
Papai soube que são cinco os ingleses: o marido, a mulher, um casal de filhos, adolescentes e um amigo, agregado da família.

25 de outubro de 1933
Os ingleses convidaram os vizinhos para uma festa em sua residência, dia 31 de outubro. Mamãe disse que certamente eles querem fazer amizade com as pessoas da vizinhança, mas que acredita que não irá ninguém por causa da casa ser mal assombrada e também por não apreciarem esse tipo de festa.
Perguntei: Que tipo de festa? E ela me respondeu: Melhor você nem saber.

31 de outubro de 1933
            Mamãe tinha razão. Ninguém teve coragem de comparecer à festa dos ingleses. Senti pena dos novos vizinhos. Fiquei também curiosa em saber que tipo de festa eles iriam dar. Mas o que eu poderia fazer? Ir até lá? E onde eu esconderia o meu medo daquela casa mal assombrada?
De repente, em resposta às minhas inquietações, uma voz surgiu não sei de onde, talvez de dentro de mim: Medo nós não escondemos. Medo nós enfrentamos.
             Sem dizer nada a ninguém, fui até a cerca de balaústra, que murava a antiga Casa Vazia, e fiquei espiando lá pra dentro, tentando encontrar coragem para entrar. De repente vi algo que me fez paralisar e perder a voz, não conseguia me mexer e nem gritar, o medo tomou conta de mim.
            Vi uma velha e horrível bruxa, dois monstros horripilantes, um deles semelhante a um morcego e outro parecido com um morto-vivo, dois pequenos e assustadores fantasmas e a mais assustadora das criaturas: um cavaleiro de cabeça de abóbora e olhos chamejantes a me fitar.  
            O cavaleiro começou a vir em minha direção...
            Desmaiei.
Acordei em minha cama.
Mamãe disse que alguém bateu palmas lá fora e quando ela saiu para ver do que se tratava, eu estava caída e desacordada perto do portão, mas não havia mais ninguém comigo.
***
            Os excertos que você acabou de ler foram copilados do diário de minha avó, que na época, por não conhecer as comemorações do Dia das Bruxas, confundiu fantasia com realidade ou realidade com fantasia, acredito que não exista tanta diferença assim.
***
            Eu era um adolescente quando conversando com a minha avó soube de um segredo que ela só revelou para mim:
             – Meu neto, nem todas as criaturas que vi naquele dia eram pessoas fantasiadas.
            – Sério! Conta mais, vó!
            – Na casa havia cinco pessoas, não é mesmo?
            – Sim. O marido, a mulher, o casal de filhos e o tal agregado da família.
            – E os fantasmas, quantos eram?
            – A bruxa, o morto-vivo, o vampiro, os dois pequenos fantasmas e o cavaleiro de cabeça de abóbora e olhos chamejantes... Seis.
            – Não poderia o sexto fantasma ser um convidado?
            – Até poderia, mas não era. Pois o cavaleiro de cabeça de abóbora, eu continuo o vendo até hoje. Com o tempo, nós nos tornamos amigos. Ele me contou que já estava na casa antes mesmo dos ingleses e ali permaneceu após a partida deles. Nesse momento, enquanto conversamos, ele está aqui, nos observando.
            – Vó, deixe de brincadeira.
            – Mas é verdade. Você não pode, mas eu o vejo, o cavaleiro está atrás de você. Se não acredita, meu neto, então tome esse anel e, com as mãos atrás das costas, esconde-o em uma das mãos. Ele vai me dizer em qual você escondeu.
            – Tudo bem. Pronto.
            – Mão esquerda.
            – Foi sorte, vó. Vamos de novo.
            – Esquerda novamente.
            – Mais uma vez para que eu acredite.
            – Tudo bem.
            Eu escondi o anel no bolso.
– Em qual das mãos?
– Você o guardou no bolso.
Fiquei horrorizado. Percebendo meu espanto, vovó me tranquilizou.
– Não tenha medo meu neto, o cavaleiro de cabeça de abóbora é uma alma boa.
– Mesmo assim, vó, não será tão fácil me acostumar com a ideia de que a senhora conversa com um fantasma. Mas, por que me contou essa história?
– Pra que um dia você escreva um conto sobre o meu amigo Cabeça de Abóbora – ela riu.
 – Quem sabe um dia eu me torne escritor.
***

Comentários

  1. Hum......isso me fez lembrar sobre a lenda do Jack cabeça de abóbora kkk vc já ouviu falar dele?

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    1. Boa Marcão! Não ouvi, mas vou dar uma pesquisada! Obrigado por ler nossos contos! Abraços!

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