O Guardião: A Origem do Mal - Meg Mendes



Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Ed, Natanael e Carlos, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Meg Mendes ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.



O Guardião: A Origem do Mal

Meg Mendes



1920
Era o dia das bruxas.   Jacob e Kyle estavam sozinhos em sua casa. Jacob queria sair com os amigos, mas teria que ficar e cuidar do seu irmão mais novo. Não entendia porque a responsabilidade era sua se nunca quis um irmão. os pais dos garotos estavam fora em seus trabalhos, a mãe numa oficina de costura e o pai na lavoura.
Kyle tinha 10 anos e como crianças da cidade solicitava a atenção do mais velho.
— Vamos Jacob, vamos esculpir as abóboras para decorar o gramado.
— Já disse que não quero.
— Ah vai por favor! Mamãe disse para você ser bonzinho comigo.
Depois de alguma insistência do mais novo, os dois foram para quintal nos fundos da casa de madeira munidos de abóboras grandes que seu pai trouxera da lavoura e de ferramentas pontiagudas para esculpir na fruta.
O mais velho fez uma incisão na parte debaixo da abóbora e começava a tirar as sementes.
— Assim está errado, você tem que cortar em cima. — Kyle observou.
— Eu corto do jeito que quiser e se você continuar me importunando, eu corto você.
Kyle continuou seu trabalho sem falar mais nada ao irmão, não queria aborrecê-lo. O pequeno sentiu um pouco de dificuldade em esculpir o fruto, mas não ousou pedir ajuda.
Jacob terminou rapidamente o trabalho com abóbora e entrou na casa, voltando logo em seguida com uma pá.
— O que você vai fazer? — Kyle perguntou curioso.
— Termine sua abóbora e me deixe em paz, garoto chato.
Ele se ateve a tarefa, vez ou outra acompanhava o movimento do mais velho com os olhos. Perguntava-se o que o irmão queria com aquele buraco que cavava no quintal.
Apenas ficou olhando. O sol começava a se pôr no horizonte, logo seria a hora de pedir guloseimas e isso alegrou Kyle. Sua abóbora estava quase pronta, porém menos assustadora que a do irmão, mas não tinha importância.
 Jacob se concentrava em sua tarefa de abrir um buraco no chão de terra batida. Quando estava satisfeito com a profundidade ele chamou por Kyle.
— Que tal darmos alguns sustos no pessoal que vier procurar por guloseimas?
 Kyle ficou com o rosto iluminado. Seu irmão havia preparado algo para fazerem juntos e ele então não pensou duas vezes para topar a brincadeira.
— Você coloca essa abóbora na cabeça — disse enfiando a fruta esculpida na cabeça do irmão, — e entra nesse buraco. Eu vou cobrir seu corpo com terra.
—  E o que eu faço depois?
—  Você grita toda vez que alguém passar perto de você. Vão levar um susto enorme.
Jacob tinha um sorriso malicioso que o pequeno Kyle não entendia. Sem pensar nas consequências, o garoto entrou no buraco e imediatamente seu irmão colocou terra em torno de seu corpo deixando apenas a cabeça com abóbora para fora.
 No início aquilo pareceu divertir Kyle. Logo a voz de alguém chamando por Jacob foi ouvida e ele já começava a se afastar para ver quem era.
— Onde você vai? — Kyle perguntou alarmado.
— Só vou ver quem é. Fique tranquilo, vou deixar este lampião aceso aqui ao seu lado porque logo irá escurecer.
 O mais velho contornou a casa simples e olhou pela quina da parede externa, dois de seus amigos estavam parados na porta da frente.
— E aí, quais as novidades? — um deles perguntou assim que o viu.
— Ainda cuidando do seu irmão mais novo? — o outro tem um tom de sarcasmo na voz.
— Dei um jeito nele. Posso sair sem problema algum.
Jacob saiu de casa sem nem pensar em Kyle preso no buraco no quintal nos fundos.
O céu escureceu e o pequeno começava a se irritar com a demora do seu irmão.
—  Jacob vem logo! — ele gritou sem saber que tinha sido deixado sozinho.
Um corvo negro pousou no chão bem à frente do garoto e foi se aproximando. O pássaro era atraído pelo cheiro da abóbora e então bicou a casca laranjada.
— Sai passarinho. — Kyle riu da situação.
Entretanto a ave voltou a bicar. O grasnado do corvo logo se multiplicou e mais aves de mau agouro se juntaram no quintal da casa. Elas se banqueteavam com o fruto enquanto Kyle gritava em desespero com a cabeça presa lá dentro. Em minutos não havia mais abóbora para proteger o rosto do garoto. Os bicos fortes fustigavam a pele macia – bochechas, olhos, nariz, boca, testa e queixo – que virou uma massa sanguinolenta.
As aves arrancavam nacos da carne macia.

***

Quando Jacob finalmente voltou para casa, lembrou-se que havia deixado o irmão mais novo nos fundos.
— Ele deve estar apavorado.
Com uma lamparina para iluminar o caminho em mãos contornou a casa. No local onde deixara o irmão havia uma quantidade absurda de corvos. Rapidamente ele os espantou e constatou que o buraco no chão estava vazio.  O lampião que havia deixado ao lado da cabeça do irmão estava caído no chão e havia se quebrado.
Ao redor do buraco havia pedaços de abóbora e quando ele se abaixou percebeu que o solo ali estava mais escuro, colocou a mão no chão umedecendo-a. percebeu que aquilo era sangue.
— Kyle! — gritou em desespero pelo irmão.
— Se lembrou de mim? — uma voz gutural veio de trás.
Quando se virou, um ser com um macacão laranja e um saco de estopa na cabeça estava parado. Tinha estatura de Kyle, mas a voz era perturbadora.
—  Ah Jacob, não deveria ter me deixado sozinho. Você me condenou.
A criatura retirou o saco da cabeça. O horror tomou conta das feições do mais velho; seu irmãozinho tinha virado um monstro e a culpa era sua.
— Escute bem, irmão. Você contará para todo o povo que de hoje em diante as abóboras devem permanecer acesas e não devem ser profanadas. A partir de agora eu serei o Guardião das Lanternas e consumirei as almas daqueles que se atreverem a me desrespeitar. Permitirei que você viva desta vez.
Jacob estava gelado, a voz áspera que em nada se parecia com a do garotinho de 10 anos, lhe evocava medos que desconhecia.
— Farei isso, Kyle.
— Kyle está morto. Eu sou o Guardião.
 E fragmentando-se em uma névoa o ser desapareceu.

Jacob nunca conseguira esquecer atrocidade que cometeu e morreu louco alguns anos depois. Porém todas as lanternas agora possuíam uma vela acesa em seu interior para conduzir as almas dos mortos. E em todas as noites de Halloween o Guardião voltava para zelar por sua lanternas. 

Comentários

  1. Minha nossa! Tudo de sombrio que envolve crianças fica mais pesado do com adultos

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    1. Fica mesmo! Crianças são tão inocentes que qualquer terror coma elas é algo muito assustador.

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