Dearg-Due: O Beijo da Morte - Natanael Otávio
Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Ed, Natanael e Carlos, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Natanael Otávio ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.
Dearg-Due: O Beijo da Morte
Natanael Otávio
Kevin Fitzgerald
Kevin Fitzgerald era considerado uma promessa do
boxe. Ele havia vencido as seis lutas anteriores, cinco delas por nocaute. Mas,
após ser derrotado no último fim de semana por Tyrone Quinn, um adversário
menos badalado e aparentemente mais fraco, o lutador irlandês não aceitou bem o
resultado e disse que os juízes favoreceram o seu rival.
Após
a luta, Fitzgerald foi para um bar, encheu a cara, brigou com alguns
frequentadores do local. Estava visivelmente descontrolado.
De
madrugada, já no sítio onde morava, agrediu covardemente a esposa, a jovem e
encantadora Margareth, que ficou toda machucada.
Kevin
alegou estar num parafuso medonho por causa da derrota, prometeu que não faria
mais isso.
Foi a primeira vez que
me bateu, refletiu a esposa. Acredito em suas palavras.
Porém,
o boxeador fez outra vez. Bastou ser derrotado novamente. Além disso, Fitzgerald
passou a beber com mais frequência e a bater em Margareth quase todos os dias. As
pessoas comentavam as marcas no corpo da jovem, alguns até perguntavam se Kevin
a agredia, mas ela se negava a acusar o marido e sempre inventava alguma
desculpa para livrar a cara dele.
Esse
enredo passou a se repetir, até que, em uma bela manhã de inverno, Kevin
Fitzgerald foi encontrado morto num bosque, próximo à cidade. Ele estava branco
como se todo o sangue tivesse fugido de seu corpo e seco, tipo pele e osso, em
nada lembrava o forte boxeador.
Amigos
relataram estar com Kevin em um bar quando uma mulher muito bonita e sedutora se
aproximou dele e eles ficaram bebendo e conversando por um bom tempo; disseram
que o boxeador e a mulher saíram juntos de lá e que era primeira vez que a viram,
provavelmente, uma forasteira.
Após
meses do ocorrido, as investigações sobre o caso não deram em nada, ninguém
conseguia explicar a horrenda morte do boxeador.
Margareth Fitzgerald
Margareth,
esposa de Kevin Fitzgerald, vivia temerosa, nunca sabia se ao voltar para casa,
o marido estaria bêbado e agressivo descontaria a sua raiva nela.
Ela não tinha parente em Waterford, sentia-se
desprotegida e não tinha coragem de denunciá-lo. Sempre, antes de dormir, rezava
para não sofrer mais tal violência.
Na
noite em que o esposo foi assassinado, ela sonhou com uma mulher que prometia
libertá-la: “Margareth, ele nunca mais vai encostar um dedo em você!”
Quando
recebeu notícia da morte e da situação em que encontraram o corpo do marido,
Margareth se lembrou do sonho e da promessa da mulher. Lembrou-se também de que
quando era pequena ouvir a sua mãe lhe contar a história de Dearg-Due, uma bela
jovem que se casou contra a vontade com um homem bem mais velho, que esse homem
era violento e batia nela todos os dia, que ela morreu de tanto apanhar. Só que
antes de morrer, num último suspiro, a jovem prometeu voltar para se vingar. Um
ano mais tarde, ela cumpriu a promessa e assassinou o marido sugando todo o seu
sangue com um beijo mortal.
Margareth
não tinha dúvidas de que fora ela, a Dearg-Due, quem deu fim à vida de Kevin, e
não chorou e nem sentiu pena dele. Teve o
que mereceu!
Dentro do bosque
–
Aqui está bom – disse Kevin Fitzgerald à bela e sedutora jovem que estava em
sua companhia. – Já pode me dar o beijo que me prometeu no bar.
–
Ante, quero que você me bata!
–
Como assim?!
–
Vamos, boxeador, quero que me acerte no rosto!
–
Não entendo o motivo de você querer apanhar, mas gostei! Saiba que sou bom
nisso!
–
Sim, eu sei!
Kevin
a atacou com um soco, mas ela segurou a sua mão e começou a torcer o seu braço,
fazendo-o ajoelhar de dor.
–
Nunca mais você irá bater em uma mulher!
–
Quem é você?! – perguntou o pugilista, assustado, percebendo-a não se tratar de
uma pessoa comum.
–
Sou Dearg-Due!
Ela
o levantou do chão como se levantasse uma pena e o olhou direto nos olhos:
–
Toma o seu beijo.
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