Atrás de Você - Natanael Otávio


Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Morphine, Natanael e Carlos, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Natanael Otávio ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.


Atrás de Você

Natanael Otávio


A fogueira acesa. Os jovens reunidos ao redor do fogo contavam histórias de terror. Pela regra do grupo cada um dos integrantes trazia um pedaço de madeira ou galho seco de árvore para jogar na fogueira assim que começasse a contar a sua história.
 — Bianca, acrescente mais lenha à nossa fogueira — disse Igor.  
— Hoje eu só vim para ouvir — disse Bianca. — Não estou muito inspirada.
— E você, Rogério?
— Depois eu conto.
Um homem entre quarenta e cinco e cinquenta anos de idade que, de longe, observava os jovens se aproximou da fogueira.
— Posso contar uma história? — Ele segurava um pedaço de madeira.
— Quem é você? — perguntou Igor — Nunca o vi por aqui.
— Me chamo Paulo. Morei nesta vila na década de oitenta. E a história que pretendo contar aconteceu de verdade.
— O que vocês acham? — perguntou Igor ao grupo.
— Acho interessante. — respondeu Carol. — Eu acho que ele pode contar.
— Eu também — concordou Bianca.
Márcio, Leandro e Rogério também concordaram.
— Tudo bem, Paulo — disse Igor —, é sua a palavra.
Paulo atirou na fogueira o pedaço de madeira que segurava.
— Era o ano de 1986 e bem ali, naquele predinho — indicou ele —, que hoje funciona uma oficina, havia uma lojinha de discos. O dono era pai do Tiago, amigo meu. De noite, quando a loja estava fechada, íamos para lá ouvir nossas bandas de rock preferidas. Um dia o Sérgio, que era amigo nosso, ficou sabendo de uma história de que existia alguns discos que traziam gravadas mensagens subliminares, e se os rodássemos ao contrário, era possível ouvi-las.
“É claro que nós duvidamos dessa história, mas, para tirarmos a prova, começamos a girar os discos ao contrário, até que em um deles surgiu um a voz bem rouca e fantasmagórica dizendo: O que você procura, está atrás de você. Logo atrás de você.
Saímos todos correndo. Morrendo de medo. Depois, ninguém lembrava mais de qual disco se tratava. Então, contamos tudo ao Marcão, que era fotógrafo e irmão mais velho do Tiago. Ele teve a ideia de botarmos o disco para rodar ao contrário outra vez e fotografar no momento em que a voz surgisse. Ele nos disse que o que escapa aos olhos humanos, a lente de uma câmera poderia captar, que se existisse mesmo algo de extraordinário, nós descobriríamos o que era.
Voltamos à lojinha na noite seguinte. O pai do Tiago havia reorganizado os discos, então, mesmo com muito medo, tentamos um por um novamente e quando a voz surgiu repetindo o mesmo recado:  O que você procura, está atrás de você. Logo atrás de você. O Marcão bateu a foto. E ao revelar a fotografia, ela mostrava a silhueta meio esfumaçada de um ser monstruoso com chifres e segurando um garfo enorme. Até hoje eu me arrepio ao contar essa história.
Depois disso, os pais dos meninos venderam a casa e o prédinho e se mudaram da cidade. Nunca mais os vi. Anos depois eu também me mudei daqui, mas de vez em quando eu volto para passear.
— Paulo, apesar de não acreditar que seja verdadeira essa sua história, ela é mesmo de arrepiar — disse Igor. — Bom, galera, já está tarde, acho que é melhor irmos nessa. Quem não contou hoje, conta na próxima.
Todos concordaram com Igor e começaram a se movimentar para irem embora, quando ouviram: O que você procura, está atrás de você. Logo atrás de você. E na fumaça expelida pela fogueira já quase apagada, eles tiveram a impressão de ver a mesma imagem fantasmagórica da fotografia descrita por Paulo, mas ninguém ficou lá para ter certeza.

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