A Ciranda das Saias Brancas - Natasja Haia
Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Morphine, Naiane e Natasja, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Natasja ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.
A Ciranda das Saias Brancas
Natasja Haia
Era
o terceiro ano do ensino fundamental, primeiro dia de aula na minha nova
escola. Um complexo de estruturas antigas, uma capela e um convento. Logo nas primeiras semanas fiz amizade com a
turminha popular da sala, Victoria, Diego, Rui, Laís e Carol. Tínhamos entre
oito e nove anos. O uniforme feminino
era composto de uma saia rodada branca e uma blusa de golas vermelhas. Um ar
europeu no calor amazônico, a antiga Paris dos Trópicos, Manaus.
À
medida que os meses passavam, eu comecei a perceber que eles eram populares
porque guardavam um segredo, os detalhes da história do colégio, mais
precisamente, de quando ainda era um internato, e que eram os únicos que já
haviam conseguido ir até o cemitério que ficava na área entorno do convento. Eu insistentemente pedia para que me
revelassem, mas era em vão, sempre recebia a mesma explicação “Aqueles que sabiam o segredo adquiriam uma
árdua lição”.
Eu,
aos oitos anos, com um ávido espírito curioso e descobridor, não me contentava
em ser deixada para trás, como se não fosse confiável o suficiente para ter o
direito de saber a respeito dos mistérios que rondavam aqueles corredores escuros
e melancólicos. Então, aguardei pacientemente até que a oportunidade chegasse.
Todos estavam muito felizes com o piquenique e ao mesmo tempo extremamente
distraídos. Saí sem que ninguém percebesse. Foi relativamente fácil passar pelo
convento, as freiras já idosas estavam recolhidas em suas rezas diárias. Meus
sapatos tocavam vagarosamente a grama, e meu olhar assustado admirava as
borboletas que voavam pelas plantas. Uma hora já havia se passado até que
avistei algumas poucas cruzes em paralelo. Estarreci, um medo aterrorizante
começou a percorrer as minhas veias, eu estava pingando de suor, e um vento
inexplicavelmente forte começou a bagunçar os meus cachinhos.
Eram
cinco lápides. Cada uma possuía uma cruz coberta de flores. Atrás havia um
pequeno templo com velas acesas e as seguintes palavras “A ciranda das saias
brancas” esculpidas em mármore branco. Letícia, Maria Fernanda, Sabrina, Alice
e Ana Vitória. Todas mortas em 1938 aos nove anos de idade. Comecei a correr
sem parar, e enquanto minhas saias balançavam contra o vento, eu via imagens de
cinco meninas em uma dança de roda, elas sorriam enquanto o sol irradiava sobre
seus rostos. De repente eu caí e tudo se apagou.
—
Ana Vitória! Ana Vitória! Olha pra mim!
Abri
os olhos e avistei a face assustada da Laís tentando me reanimar. Relatei a
eles tudo que havia visto. Nunca me esquecerei dos olhos do Diego ao me contar:
—
Estudamos nessa escola desde o primeiro ano do ensino fundamental. No início
éramos só crianças amedrontadas por ouvir escondidas a história que os adultos
contavam. Em 1938 cinco meninas foram encontradas mortas por uma professora e
uma turma do quinto ano na área atrás da capela. Tinha sangue derramado de suas
narinas. A autopsia não conseguiu determinar a causa da morte. E os pais
decidiram que elas seriam enterradas na escola em uma cerimonia religiosa. A
história rodou o país. E há relatos de crianças que as viram em diversas
escolas de freiras do país. Nós fomos até onde elas estão enterradas final do
ano letivo passado. Nada de anormal ocorreu durante as férias. Até que... (um
silêncio pairou no ar). Bem... Você começou a estudar conosco.
—
Como? (eu não compreendia onde eu entrava nessa história).
—
Ana Vitória, só nós a vemos. Começamos a estranhar quando nossos pais começaram
a nos levar ao psiquiatra. Então um dia retornamos aquele cemitério e
descobrimos que mais a frente, atrás de um bambuzal, tinha objetos pessoais das
meninas e porta retratos. Vimos você. Foi um choque. Mas como poderíamos temer
a quem já amávamos?
Escrevo
isso observando as crianças da escola brincarem. Dez anos se passaram, meus
últimos amigos cresceram, perderam o dom de me ver, foram embora e seguiram
seus caminhos. Nunca mais tive notícias. Permaneço aqui, nesse limbo que adoro.
Pois eu sou a lenda!
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