Nunca Mais - C. B. Kaihatsu
Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Morphine, Naiane e Natasja, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
C. B. Kaihatsu ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.
Nunca Mais
C. B. Kaihatsu
Edgar
acordou suando frio, tivera um pesadelo, o mesmo em semanas. “Nunca mais”, eram
as palavras que ecoavam em sua mente, ditas por um majestoso e nefasto corvo.
A
ave agourenta era seguida por uma mulher que ele reconheceu como sua amada e falecida
noiva Annabel Lee. Ela estava ainda mais bonita que a última lembrança que
Edgar tinha da mulher em quanto ainda lhe restava um sopro de vida. De súbito,
a expressão doce de sua amante se desvaneceu e Annabel lhe lançou um olhar
colérico. “Tu és um mentiroso, Edgar! Abandonou-me no além-vida!”, ela dizia
enquanto arrancava com as mãos o coração de Edgar e o corvo repetia sem parar,
“Nunca mais”.
Dia
após dia, a sanidade de Edgar se esvaía, seus nervos estavam em frangalhos. O
homem mal dormia, não queria ter o nefando pesadelo, no qual sua outrora amada
Annabel Lee se tornava um diabólico anjo da morte. Embora ele não pudesse
controlar seus sonhos, ele sentia que eles maculavam a memória de sua amada.
Mesmo
nos pequenos intervalos nos quais, devido à exaustão, ele se permitia dormir,
Annabel Lee surgia, sempre com o corvo ao seu lado. A cada aparição o coração
dela parecia cada vez mais tomado pelas trevas. Já a sinistra ave parecia ser o
mal encarnado, era como se pudesse enxergar a alma de Edgar e extingui-la aos
poucos.
Após
três dias sem dormir, Edgar deu um breve cochilo. Acordou sentindo dolorosas
pontadas nas mãos. Ao abrir os olhos, constatou que as pontadas eram, na
verdade, bicadas do terrível corvo que habitava em seus sonhos. Espantou a ave,
contudo, pensou estar dormindo e vivendo em mais um pesadelo. Esse pensamento
sumiu rápido de sua mente, a dor era real e o sangue em suas mãos também.
O
corvo voou para longe entoando um lamento que consistia em duas palavras que
Edgar conhecia bem, “Nunca mais”.
O
homem achou que estava ficando louco ou que então havíamos chegado ao fim dos
tempos. Não conseguia se acalmar, tampouco formar um pensamento coerente.
Dirigiu-se até a sala de estar e serviu-se de uma dose de bourbon. O líquido âmbar desceu queimando. Serviu-se de mais uma
dose, sentiu que se não o fizesse perderia o fiapo de sanidade que lhe restava.
No
momento em que a garrafa ficou completamente vazia a ave agourenta retornou,
voava em círculos em torno de Edgar, repetindo sem parar seu habitual mantra
“Nunca mais”.
Edgar
vislumbrou uma silhueta feminina, que ele julgou ser de Annabel. Quando ele
pôde ver com clareza a figura que estava à sua frente, ele foi tomado pelo
pavor.
A
Annabel Lee, que também deixara o seu sepulcro como nos sonhos, não era a mesma
que aparecia quando ele adormecia. O olhar colérico era o mesmo, contudo, o que
se apresentava diante dele era um corpo humano em decomposição.
“Por
que me abandoaste, Edgar? Prometemos viver juntos pela eternidade. Eu lhe dei
meu coração, mas você não me deu o seu. Estás em dívida comigo e chegou a hora
de cobrar”.
Edgar
estava tão exausto que não protestou, apenas resignou-se. Sentiu uma dor lancinante
lhe rasgando o peito.
No
dia seguinte, a pequena cidade amanheceu em choque. O coveiro não podia
acreditar no que via. Um túmulo fora violado. O da jovem Annabel Lee. Ao lado
do seu corpo em avançado estágio de decomposição estava o corpo de seu noivo Edgar.
Havia um buraco no peito do homem e o coração havia sumido.
Quem
passasse à noite no cemitério, podia ver um corvo pousado no jazigo do jovem
casal. “Nunca mais”.
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