Nosso Novo Lar - Meg Mendes
Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Morphine, Naiane e Natasja, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Meg Mendes ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.
Nosso Novo Lar
Meg Mendes
A vida não tem sido nada fácil para Liam. Desde que seu pai morreu, ele
e sua mãe têm passado mais tempo mudando de casa e cidade do que conseguem se
lembrar, tentando recomeçar sua vida enquanto buscam um lugar para chamar de lar.
Emma fica sabendo de uma grande casa disponível em uma pequena cidade no
interior, que possui um valor bem acessível. O local possui um entorno
maravilhoso, e pelo que ela pôde perceber, fica um pouco afastado das demais
casas da região, o que lhes daria uma certa privacidade. Liam não acha a casa
tão magnífica como sua mãe, mas para quem passa mais tempo na estrada, aquela
bem que poderia ser uma parada fixa, devolvendo a esperança de um lar para o
garoto.
A velha moradia esteve fechada por tanto tempo, que os poucos móveis
carregam consigo um grande volume de poeira, mesmo que estivessem cobertos com
panos. Mãe e filho não reclamam muito, afinal aquele lugar é sua nova casa, e
com um pouco sorte, eles poderão chamar de lar.
Uma senhora que sabendo da chegada dos novos moradores, lhes oferece uma
torta como boas-vindas ao bairro. Emma e Liam ficam muito felizes com o gesto
simpático da idosa que se apresenta como sendo a vizinha mais próxima.
Ela conta que a casa é amaldiçoada e que não sabia como eles tinham coragem
de morar naquele local. Quando questionada sobre essas histórias de fantasmas e
maldições por Emma, a senhora apenas comenta:
— Cuidado com o ceifador. Ele mora nas profundezas da escuridão. Durante
o dia ela fica fechada, mas a noite ele implora para ser solto e rouba aquilo
que você mais ama.
Ao terminar de dizer essas palavras, ela percebe que a pequena família a
olha como se ela fosse uma louca, e temendo não ser bem-vinda, deixa-lhes com a
torta e despede-se.
***
Conforme vão arrumando as coisas, ao final do primeiro dia, Emma entrega
algumas caixas para o menino e ao observar melhor, nota que havia uma pequena
despensa logo abaixo da escada. Ela pede para que ele guarde as coisas no lugar
para depois ver o que faria. Está nitidamente exausta.
Quando o menino abre a porta, algumas coisas que estão empilhadas caem,
fazendo com que ele reclame por ter mais caixas e bugigangas para arrumar. Liam
começa a ajeitar as coisas quando nota uma porta no fundo do armário. Curioso,
tenta abri-la, mas para seu espanto, atrás dela não há nada, apenas uma parede.
— Quem colocaria uma porta dentro do armário que ao abrir não leva a
lugar algum?
— O que disse Liam — pergunta sua mãe ao passar por ele no corredor.
— Veja mãe, tem uma porta aqui dentro. Mas ela não serve para nada. Sabe
o que tem atrás dela?
— O quê?
— Uma parede! — ele responde com um olhar pensativo enquanto revela a
passagem obstruída para a mãe.
Os dois permanecem um tempo examinando a inutilidade aparente daquilo,
até que Emma se cansa e decide encerrar o dia.
— Deixa essa porta pra lá, querido. Vamos dormir, está tarde e ainda
teremos muita coisa pra fazer amanhã.
***
Durante a noite, Liam desperta com barulhos vindos do andar térreo.
Lembrando-se de que está em um novo lar e que se trata de uma casa muito
antiga, ele logo torna a dormir ignorando o medo. Em pouco tempo desperta
novamente com barulhos de alguma coisa batendo em madeira. Assustado,
levanta-se calçando seus chinelos ao lado da cama. Dessa vez o barulho fica
mais forte, como se fossem batidas na porta.
Caminhando lentamente, ele sai do quarto passando pelo corredor e desce
as escadas. Ao abrir a porta da frente, percebe unicamente o frio e a escuridão
da noite local.
Tornando a ouvir os barulhos, volta-se com o olhar para dentro de casa
quando escuta um sussurro.
Liiiaaammm
Seu nome pronunciado de forma longa e baixa em meio a batidas tão
fervorosas como se alguém estivesse tentando arrebentar uma porta fazem com que
o garoto sinta o medo percorrendo toda a extensão de sua coluna.
Sabia que o sono pesado de sua mãe somado ao cansaço não deixaria que
ela acordasse mesmo com todos aqueles barulhos que ele não sabia mais se eram
reais ou apenas fruto de sua mente entorpecida pelo local.
Ao ouvir novamente seu nome ecoando pelo corredor, assombra-se ao
perceber que o som vem do armário que ficava embaixo da escadaria.
Aproximando-se bem devagar, abre a porta e nota que a porta que fica do
lado de dentro da dispensa, parece emitir um brilho como se houvesse luz do
outro lado. Os sons saem daquele local, o que é impossível uma vez que atrás
daquela pequena porta, existe apenas uma parede.
Com a insistência dos barulhos e sussurros que se tornam cada vez mais
intensos, agora que o menino sabia exatamente de onde vinham, ele toma coragem
e abre a porta.
Um brilho ofuscante acende-se sobre ele, e no momento em que a luz
diminui o que ele vê deixa-lhe de boca caída. Seu pai, Jacquem que havia
falecido, está ali bem à sua frente com a expressão vazia e cadavérica.
Jacquem fica parado olhando para o garoto. Liam sente medo, mas não
consegue mexer um único músculo. O frio emanado da figura diante de si
provoca-lhe, como um chamado para a morte.
— Pa...papai?
O espírito atordoado da lembrança do pai de Liam, esboça um leve sorriso
estendendo-lhe a mão apontando a direção do espaço aberto onde antes havia uma
parede por detrás da porta.
Movendo-se na direção em que aponta, olha incisivamente para o garoto
que como conduzido pela pessoa mais amada do mundo, segue-o atravessando uma
barreira desaparecendo na escuridão.
***
Quando Emma acorda, procura Liam por toda a casa, mas não encontra em
nenhum lugar. Ela chega a procurar na despensa embaixo da escada, porém o
armário está normal, e não há nenhum sinal do garoto ali. Ao abrir a porta que
fica do lado dentro, encontra apenas uma parede, bem como o próprio filho tinha
mostrado no dia anterior.
Desesperada, corre pelo jardim em frente da casa gritando pelo nome do
menino e pedindo por ajuda. Ao longe, a velha senhora, que gentilmente havia
lhe oferecido a torta, observa tudo com olhar triste e profundo.
“Eu avisei eles para que não ficassem naquela casa maldita”
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