A Distância Entre as Sombras e a Queda - Morphine Epiphany
Cinco. Cinco vogais. Cinco sentidos. Cinco amigos. Cinco escritores. Camila, Meg, Morphine, Naiane e Natasja, esse é o Clube dos Cinco. Eles se reúnem à meia-noite em volta de uma fogueira, abrem uma boa garrafa de vinho e contam histórias.
Morphine Epiphany ergueu sua taça e disse de modo solene: “Declaro iniciada a reunião do Clube dos Cinco. Espero que apreciem a minha história”.
A Distância Entre as Sombras e a Queda
Morphine Epiphany
Conto inspirado na música ''Sleepwalking'' da
banda Bring Me The Horizon
Entre a sinfonia das sombras e a agonia de seus
ossos, Daniel despertou. Largado no tapete do quarto, sentia a pele repuxando e
o fôlego se esvair feito uma fúnebre melodia que antecipava o luto.
Era a terceira vez naquela semana. Os episódios
amedrontadores do sono se tornavam frequentes. Pensou em tomar algumas pílulas
para adormecer por completo, mas logo, essa ideia se desfez. Ele queria
enfrentar aquela experiência de forma sóbria. Precisava encarar as fotografias
de sua mente.
********
A televisão permaneceu ligada, a madrugada se
aproximou e Daniel tentou manter os olhos abertos. Lentamente, os relógios
paralisaram no mesmo horário. O jovem adormeceu profundamente. Imagens do seu
cotidiano surgiam em seus sonhos e uma calmaria se instalava em seu corpo.
Com o avanço da alvorada, os olhos dele se
abriram bruscamente. O quarto estava preenchido pelo som melódico que vinha das
sombras. Os pés de Daniel o conduziram na direção das trevas. Seus olhos
seguiam abertos, mas em pleno vazio. A música da escuridão dominava os membros
dele.
Sussurros se misturaram com sílabas melódicas.
Eram uma espécie de prece levando sua carcaça para um novo lugar. Os espelhos
do quarto se multiplicaram e tomaram as paredes. Os sussurros ficaram cada vez
mais audíveis.
Ele seguiu pelos corredores, desceu as escadas e
abriu a porta da frente. Quando seus pés, tocaram o jardim, as sombras se
aproximaram e o embalaram. Por algum tempo, os pés de Daniel ficaram leves e
facilmente conduzidos. Palavras confusas e sussurradas atravessavam seus
ouvidos e ditavam a direção a ser seguida.
A sola de
seus pés entrara em contato com uma superfície rochosa. Uma sensação dolorosa
percorreu-lhe os pés. O sangue escorria, os sussurros se distanciaram e as
sombras o deixaram livre. Ele recobrou a consciência quando seu corpo estava
quase deslizando pelo precipício. Fôlego curto e desespero o acompanhavam.
**********
Duas noites sem dormir, após ser abandonado no
precipício. As garrafas de café esvaziaram-se, os filmes começaram a deixar
seus olhos pesados, o banho lhe trazia relaxamento. Resolveu investir em doses
de água gelada no rosto para se manter desperto. Nada fazia efeito. A letargia
era inevitável.
O esforço foi substituído pela sonolência e o
organismo derrotado pelo cansaço. Não conseguia mais se manter em estado de
alerta.
As sombras assumiram o controle e os murmúrios
adentraram as têmporas de Daniel. Ele não comandava mais os seus passos, seus
olhares e seus sentidos. A penumbra o abraçou.
Na escuridão, em pleno transe, foi transportado
para o seu terror. Daniel, estava tentando se segurar enquanto o seu corpo
flutuava Olhos arregalados, mas sem vestígios conscientes. Ele olhava o
precipício ganhando distância durante a sua queda. O tempo parecia não
prosseguir. Só existia sua carne prestes a ser dilacerada.
Sem ar nos pulmões e com a pele a ponto de ser
completamente rasgada, ele se sentiu levemente acordado.
***************
O buraco apesar da profundidade, dava-lhe uma
sensação confortável. Não sentia nenhuma costela quebrada. Nenhum sangramento.
Estava seguro ali. A queda não lhe causou ferimentos e a realidade era absurda.
Ergueu-se para levantar e procurar uma saída
daquele buraco. Suas pernas não responderam. Sua coluna travada e sua cabeça
estática. O corpo queria levantar, as sombras lhe obrigavam a ficar imóvel.
Queria pronunciar alguma palavra, queria gritar,
queria se mexer. O breu destruía suas forças. Pequenos pontos de luz
despontaram no formato de dois olhos. Eles observaram Daniel e o cercaram.
Uma febre caminhava por todos os poros de sua
matéria, causando-lhe explosões dolorosas. Os olhos da escuridão chegaram mais
perto, roubando a respiração de Daniel. Os batimentos já não dançavam no ritmo
da existência. Havia apenas o sombrio devorar perpétuo.
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